segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O PNDH e os hipócritas


“Apoiar (...) o controle democrático das concessões de rádio e TV, regulamentar o uso dos meios de comunicação social e coibir práticas contrários aos direitos humanos. Garantir (...) a fiscalização das emissoras de rádio e televisão, com vistas a assegurar o controle social sobres os meios de comunicação e penalizar, na forma da lei, as empresas que veicularem programação ou publicidade atentatória aos direitos humanos”.
“Adotar medidas destinadas a coibir práticas de violência contra movimentos sociais que lutam pelo acesso à terra. Apoiar [a criação de uma lei que condicione a reintegração de posse] à comprovação da função social da terra”.
Antes de qualquer coisa, convém esclarecer que os trechos acima não integram o Plano Nacional de Direitos Humanos do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apresentado à nação recentemente. Sim, eles fazem parte de um plano de direitos humanos, porém, de outro, assinado no dia 13 de maio de 2002 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Lá, diferentemente de agora, não houve a grita geral de setores da chamada sociedade civil. Não houve manifestações intempestivas da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), presidida pela combativa senadora Kátia Abreu (DEM-TO), cuja posse de suas fazendas encontra-se sob investigação de procuradores federais sob suspeita de grilagem. Em 2002 a igreja católica não veio a público vociferar contra a proposta de união civil e direito de adoção dos homossexuais, acusando o decreto do PNDH de “antidemocrático”.
Ora, ora, mudaram-se as circunstâncias, portanto, nada mais natural que mudassem também as críticas. Ocorre que, o objeto criticado não difere em nada da proposta anterior do Plano Nacional de Direitos Humanos, apresentada em 2002. A única diferença é que o ocupante do Palácio do Planalto, que assinou o decreto, é outro: saiu o “príncipe dos sociólogos” e entrou o torneiro mecânico.
Em seu último ano de mandato, Lula goza de um prestígio, interna e externamente, que o “príncipe dos sociólogos” não teve ao final de seu segundo quadriênio na Presidência da República.
Aqui está a chave que abre a caixa de preconceitos, recalques e ressentimentos nutridos pela oposição política, por setores conservadores da sociedade e os principais veículos de comunicação do país, sobretudo, os dois grandes jornais paulistas e a TV Globo.
Lula se comunica diretamente com a população, fala a linguagem da gente simples e dispensa a intermediação, repele o sistema de “agenda setting”. E isto é inaceitável para os meios de comunicação brasileiros, que continuam acreditando que ainda podem influenciar a sociedade e apontar os caminhos por ela deve seguir. O rumo que a ela – a sociedade – segue, atualmente, é bem diferente daquele desejado pelos meios.
Com mais de 80% de aprovação popular e, ainda por cima, o brasileiro mais confiável, segundo pesquisa do Datafolha, Lula é um cabo eleitoral invejável. E nesta condição poderá influenciar diretamente os resultados das próximas eleições. Isto incomoda a elites social e política, que se reúnem nos salões luxuosos e passam o tempo fazendo piadinhas que exalam o mais puro e repugnante preconceito social.Impossibilitados de atacar frontalmente o presidente, a oposição política, meios de comunicação e os ricos, à maneira do lutador de boxe, tentam minar-lhe a resistência, batendo seguidamente na linha da cintura. Mas, pelo visto, a estratégia não vem dando certo. As últimas pesquisas eleitorais que o digam.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Torcidas Organizadas


CENA 1 – Última rodada do Campeonato Brasileiro de 2009; Coritiba e Fluminense disputam partida de alto risco na capital paranaense. O vencedor garante sua permanência na elite do futebol brasileiro; mas, o clube carioca, “tantas vezes campeão”, pode escapar de mais um rebaixamento em sua história com um simples empate. Fim de jogo: placar igual, queda do “Coxa” e o Flu fica na primeira. Inconformados, torcedores do clube do Paraná invadem o gramado e iniciam uma violenta batalha campal. Armados de paus e pedras, agridem tudo o que encontram pela frente; a espiral de violência rompe os limites do estádio Couto Pereira e toma as ruas de Curitiba. A maioria dos invasores pertence à “torcida organizada” Império Verde.
CENA 2 – Fim da apuração das eleições para renovação da diretoria do Santos Futebol Clube em dezembro do ano passado. Antes mesmo da abertura da última urna, está clara a vitória de Luiz Álvaro, candidato da chapa de oposição, encerrando um longo período de mandatos consecutivos de Marcelo Teixeira na presidência do clube. Integrantes da Torcida Jovem, aliados do candidato da situação, também inconformados com o resultado, irrompem em violência e, por muito pouco, não destroem completamente o Salão de Mármore da Vila Belmiro e provocam uma tragédia.
CENA 3 – O Corinthians apresenta o veterano lateral-esquerdo Roberto Carlos, que chega para ajudar o clube a conquistar a Taça Libertadores da América no ano do centenário do clube. Mais de cinco mil pessoas estão no Parque São Jorge debaixo de sol inclemente para acompanhar a entrevista coletiva do jogador. A Folha de S. Paulo chama a atenção para o evento, destacando “a força das torcidas organizadas do clube, em particular a Gaviões da Fiel e a Pavilhão 9”. A propósito, Roberto Carlos entra no gramado segurando uma camisa, um boné e uma faixa da Gaviões. Ora, ele vai jogar pelo Corinthians ou na Gaviões da Fiel?
Não se trata, aqui, de analisar o aspecto psicológico que leva os integrantes das torcidas organizadas a agirem da forma que agem. Especialistas já disseram tudo que havia para dizer sobre isso. O que interessa, neste caso, é tentar entender o porquê destas organizações terem tanta influência na política interna dos clubes de futebol. Talvez, a primeira explicação resida na relação promíscua que as diretorias dos clubes mantêm com as torcidas. Elas recebem ingressos de graça, financiamento para viagens para acompanhar jogos do time em outras cidades e estados, subsídios para atividades de caráter, digamos, social, entre outras benesses. Em troca, apoio incondicional ao dirigente de turno.
Este tipo de relacionamento não encontra paralelos em outros países. Na Europa, por exemplo, as torcidas organizadas restringem sua atuação às arquibancadas, torcendo e cantando em apoio aos jogadores. São violentas? Não restam dúvidas. Têm histórico de racismo? Na Itália e Alemanha, principalmente. Mas, o que importa é saber que elas se auto-financiam; desenvolvem atividades que lhes permitam obter recursos financeiros para bancar seus custos. E se querem intervir nas disputas políticas das agremiações, seus integrantes se associam ao clube.
No Brasil, ao contrário, boa parte dos integrantes não é associada do clube de coração, mas, sim, da torcida; e, no entanto, se julgam no direito de intervir na vida política e administrativa dos clubes. E na maioria das vezes, valendo-se de expedientes espúrios: violência, chantagem, achaques e intimidações de toda ordem. Para obter recursos, as torcidas organizadas dos clubes brasileiros também comercializam um amplo mix de produtos em que vinculam sua imagem com a do próprio clube, sem pagar nenhum um centavo por isso.
Todas as vezes em que uma ou outra torcida protagoniza um ato de violência extrema, autoridades, governos e os próprios dirigentes de clubes vêm a público cobrar soluções; e a panacéia de sempre é o endurecimento da legislação. Não há a necessidade de novas leis ou aperfeiçoamento das já existentes: basta aplicá-las e aprender com os exemplos que vêm de fora.
No estádio Heysel de Bruxelas, em 29 de maio de 1985, na final da Copa da Europa, o futebol viveu uma das grandes tragédias de sua história: morreram por asfixia e esmagamento 39 torcedores (32 italianos) que se encontravam nas arquibancadas ocupadas pelos torcedores italianos, depois de uma carga de seus rivais ingleses antes de iniciar a final.
Por conta deste episódio, os clubes ingleses foram proibidos de disputar campeonatos promovidos pela UEFA por cinco anos. Neste período, as autoridades de sua Majestade, a Rainha Elizabeth II, adotaram medidas duras para coibir a violência nos estádios de futebol. Atualmente, o campeonato inglês é considerado um dos mais disputados do mundo e forte financeiramente. Os clubes voltaram às disputas européias e vem obtendo resultados consideráveis.
A Copa do Mundo de 2014 será no Brasil, antes, porém, é preciso equacionar e solucionar o problema da violência nos estádios, para que voltem a ser o que sempre foram: palco para jogadores talentosos desfilarem seu talento pelos gramados, com festas de cores e sons vinda das arquibancadas.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

A carta ao leitor e o TCU

Em sua primeira edição do ano, a maior (?) revista semanal do país trouxe, escondida acima do nome, chamada para matéria sobre o "relevante" papel que o Tribunal de Contas da União (TCU) vem desempenhando nos últimos anos. O texto da chamada é bastante interessante: "como o TCU impede que o nosso dinheiro vá para o bolso dos malandros". A matéria em si seria irretocável, se não fosse por um pequeno detalhe: está totalmente focada em obras do governo federal atualmente "na mira" daquele órgão fiscalizador, braço auxiliar do Congresso Nacional. Talvez também seria o caso de mostrar se o furor fiscalizatório do TCU sempre esteve presente em sua história; ou se é coisa recente. Não se questiona, de forma alguma, a necessidade de órgãos fiscalizadores que garantam a correta aplicação dos recursos públicos. No entanto, não se pode usar "dois pesos e duas medidas". Além disso, se o assunto fosse mesmo relevante, mereceria a capa.
Mas, a parte mais interessante não está na matéria propriamente dita, e sim na Carta ao Leitor (eufemismo que designa o editorial daquela publicação). Ali, escondida no cipoal elogioso ao papel tribunal, está escrito que ele é bem diferente de seus congêneres estaduais, mais por aquilo que estes não fazem: fiscalizar a aplicação do dinheiro público. Assim como a pirotecnia do TCU recebeu tratamento nobre, os que os TCE's deixam de fazer também deveria ser pauta da publicação. A começar pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, que ninguém sabe se funciona. Ou será que a sigla partidária que governa o estado há mais de dez anos é motivo para que o TCE paulista seja acéfalo?