quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Quem quer ser prefeito de Campinas?

A cassação do prefeito Demétrio Vilagra não chega a ser uma surpresa. É apenas o corolário de um processo que começou com o afastamento, temporário primeiro e definitivo depois, do então prefeito Hélio de Oliveira Santos. Até as pedras da Avenida Saudade sabiam qual seria o resultado da segunda Comissão Processante instalada na Câmara de Vereadores.
Os edis já haviam decidido que, agora, eles governariam a cidade. Chega de negociar cargos e obras em redutos eleitorais. Não, daqui prá frrente eles assumiriam o controle. Para que negociar, se eles mesmo podem tomar as rédeas do poder local e nomear apadrinhados indiscriminadamente? Para que o desgate público de ter de negociar com o prefeito de turno, se existem atalhos de sobra no acesso ao butim?
Os parlamentares campineiros, cidadãos acima de qualquer suspeita, vão agora tomar de assalto a cidadela. Estes que agora se comportam como homens de elevada estatura moral, a apontar os erros e crimes cometidos pelo ocupantes do Poder Executivo, são os mesmo que, ainda recentemente, à frente de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI), criada exatamente para investigar crimes de corrupção, foram unânimes no veredicto: não havia crime alguma.
"Como o tempo ruge e a Sapucaí é longa", um novo chefe para o Executivo de Campinas será eleito. Mas, não pelo voto direto dos cidadãos. Estão os valorosos homens do Legislativo encarregados da tarefa. E o ungido sairá de seus pares. E aí, quem quer ser prefeito de Campinas? Será que algum vereador, de espírito abnegado e desapego material, se habilita à nobre tarefa?
Por conhecer os interesses dos membros de Legislativo municipal, não se vislumbra alguém com coragem para assumir. Afinal, é apenas um ano e nas condiçõe em que a cidade se encontra, segundo muitos falida e mal paga, o cargo de alcaide não apresenta muitos atrativos. O tempo é muito curto para deixar uma marca indelével na administração, algo que penetre nas mentes dos campineiros e os faça lembrar por toda a eternidade que ainda está por vir de seu autor.
E no final das contas, vão acabar escolhendo um pobre diabo. Vão prometer-lhe apoio abaixo e acima da terra, desde que, em troca, ele mantenha olhos fixos no firmamento, a mirar um futuro distante, esquecendo-se por completo do presente que está à sua volta. Este, bem, este estará a cargo dos nobres parlamentares.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Silêncio obsequioso

O jornalista Amaury Ribeiro Júnior esta prestes a entrar para a história do mercado livreiro brasileiro. Seu livro "Privataria Tucana", da Geração Editorial, esgotou a primeira edição de 15 mil exemplares em apenas três dias. Lançado na sexta-feira, dia 9 de dezembro, no domingo, dia 11, já estava em falta nas livrarias do país inteiro. E pensar que o sumiço, provocado por intensa procura, não foi provococado por nenhuma mega campanha de marketing. Pelo contrário.
A obra do jornalista aborda uma passageira da história brasileira tida por exuberante ou fraudulenta, dependendo do ponto de vista: a privatização de empresas estatais, realizada no primeiro mandato presidencial de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Ou melhor, sobre que o rolou nos bastidores. O livro revela o movimento sórdido que liquidou, na bacia das almas, todo patrimônio nacional. Pouca gente se deu bem com a venda. Certamente, a maioria da população ficou no prejuízo.
Como o Estado brasileiro estava falido e não tinha condições de realizar a modernização de suas empresas, principalmente no setor de telefonia, era preciso passá-las ao controle da iniciativa privada para que pudessem crescer e atendar a demanda dos brasileiros. Os recurosos obtidos com a liquidação seriam utilizados para abater a dívida do país.
A venda permitiu a arrecadação de US$ 100 bilhões. Foi o maior programa de privatização da história da humanidade. E para levá-lo a bom termo, atropelou-se até a mesmo a Constituição Federal, alterada sob bom soldo na calada da noite. E a dívida? Foi reduzida? Bem, a dívida, que era de US$ 144 bilhões no início do primeiro mandato de FHC, saltou para US$ 300 bilhões ao término do segundo. Apesar dos US$ 100 bilhões obtidos com a privatização.
De todo aquele processo, emergiu um figura sinistra que ocupava, à época, o Ministério do Planejamento: José Serra. Político ambicioso, useiro e vezeiro de métodos violentos nas disputas políticas que empreendia, Serra foi o artífice e, sabe-se agora, com o livro "Privataria Tucana", o principal beneficiário financeiro. Apenas isso explica o silêncio dos principais veículos de comunicação em torno do lançamento da obra de Amaury Ribeiro Júnior.
Além de ignorar e impor um silêncio obsequioso sobre o livro, os meios de comunicação, na impossibilidade de questionar e refutar os dados nele contidos, optaram por desqualificar seu autor. E, com isso, construir um blindagem em torno dos personagens citados, sobretudo, José Serra. As informações e documentos reproduzidos podem, ainda que depois de tantos, produzir estragos na biografia de muitas vacas sagradas do tucanato. Inclusive, levar alguns para a cadeia.
A primeira edição não existe mais. Esgotou-se em apenas três dias. A segunda já está no prelo. E isso revela o grau de interesse que o livro está provocando. Apesar do silêncio obsequioso, da omertà mafiosa, que a mídia tenta impor sobre ele.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

PEC 99/11 ameaça caráter laico do Estado brasileiro

A palavra teocracia não é assim tão conhecida do grande público. Entre especialistas e estudiosos da religião, ela é empregada em larga escala. Na mídia, a daqui e a de fora, ganhou sentido pejorativo, utilizada para designar o regime político que vigora no Irã, onde o poder é exercido com mãos de ferro por clérigos muçulmanos, os aiatolás. Em sentido literal, teocracia quer dizer “governo de Deus”; do grego teo = Deus + cracia = governo.
Agora, o assunto esta de volta ao centro das atenções, principalmente porque as chamadas igrejas evangélicas estão lançando mão de todos os expedientes possíveis para impor sua visão de mundo ao conjunto da sociedade; nem que para isso seja necessário passar por cima do caráter laico do Estado brasileiro.
Estado laico não é um Estado ateu. Seu caráter laico significa que ele não tem religião oficial, até porque, precisa, e deve, assegurar os direitos de cada um ter e seguir a sua fé, sem ser admoestado por isso. A partir do momento em que este caráter é ameaçado, também ameaçados estarão os direitos das minorias.
A mais nova investida vem na forma da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 99/2011, de autoria do deputado federal João Campos (PSDB/GO). A proposta do parlamentar goiano “dispõe sobre a capacidade postulatória das Associações Religiosas para propor ação de inconstitucionalidade e inconstitucionalidade no STF”. Na prática, acrescenta mais um inciso ao Artigo 103 da Constituição Federal. Este artigo diz que:
“Podem propor ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:
I – o Presidente da Republica;
II – a Mesa do Senado Federal;
III – a mesa da Câmara dos Deputados;
IV – a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
V – o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI – o Procurador-Geral da República;
VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII – partido político com representação no Congresso Nacional;
IX – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional” .
A PEC 99 acrescenta as Associações Religiosas a esta lista. Ocorre que estas organizações são constituídas de acordo com os interesses de um grupo restrito de pessoas. E o Estado não pode opor nenhum tipo de obstáculo ao funcionamento delas. Logo elas possuem um privilégio de se organizar sem que o Estado possa negar-lhes o reconhecimento de sua criação por qualquer motivo que seja.
A iniciativa de João Campos, que tem fortes ligações com a Assembleia de Deus, surgiu a partir do momento em que os parlamentares evangélicos se viram sem meios legais para questionar a decisão do STF sobre a união homoafetiva. Por aí se vê qual o alvo inicial da bancada evangélica: bloquear, via Justiça, toda e qualquer iniciativa que vise garantir e assegurar direitos a setores minoritários da sociedade como, por exemplo, os homossexuais. E isto será apenas começo.
Casamento homoafetivo? Descriminalização do aborto? Uso de símbolos religiosos em repartições públicas? Direito de existência e liturgia de manifestações religiosas que, na visão dos evangélicos, são consideradas antinatural, com aquelas de matriz africana? Tudo será passível de questionamentos no STF quanto a sua constitucionalidade, por estas associações religiosas.
De fato, mais do que orar e vigiar, estes tempos são de observar e agir. Enquanto ainda há tempo para isso.