quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Legislativo, para quê?

Por quatro votos a um, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou o casamento civil entre duas mulheres do Rio Grande do Sul, que já viviam juntas há cinco anos em união homoafetiva. A decisão veio na esteira de outra, tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em maio deste ano, que reconheceu legalmente este tipo de relacionamento como união estável, equiparando-a àquela existente entre pessoas de sexo diferente. E o que fez o STJ? Se a relação entre duas pessoas do mesmo sexo é considerada uma união estável, assegurando-lhe os mesmos direitos e garantias já previstos para uniões entre heterossexuais, por analogia, também o casamento civil deve ser permitido àqueles nos mesmos moldes do que é permitido a estes. Esta decisão não cria efeito vinculante, mas, passa a fazer parte da jurisprudência do STJ e vai balizar futuras decisões das instância inferiores.
A decisão do STJ vai obrigar o STF a se posicionar sobre o assunto, por conta da lacuna existente na Constituição Federal.  A "judicialização" da questão reflete a mudança na estratégia de atuação do movimento em defesa dos direitos dos homossexuais. "Quando todos os gays estiverem casados, o Congresso Nacional vai aprovar o casamento. Por isso, estamos largando a toalha do Legislativo e para atuar no Judiciário", confirma Toni Reis, presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais.
Cada vez mais o Judiciário é chamado para intervir e arbitrar questões que não encontram guarida na Constituição. O casasmento entre pessoas do mesmo sexo é uma delas. Se não há impedimento legal, não haveria como proibi-lo. E por que não existem leis que regulamentem a questão. Isto não é responsabilidade do Legislativo? Por que, então, ele não cumpre com suas responsabilidades constitucionais?
O Parlamento, há tempos, deixou de ser a "casa de leis" para se transformar na trincheira onde os diferentes grupos, sobretudo aqueles de natureza religiosa, se encastelaram para defender suas posições e tentar impô-las ao conjunto da sociedade. E se não conseguem impor sua ideologia, bloqueiam e impedem qualquer iniciativa que julguem ameaçadoras a sua forma de pensar; ainda que elas representem a consolidação de direitos para outros grupos.
Exemplar deste compormento foi a reação do deputado do PSDB por Goiás, João Campos, que integra a chamada Frente Parlamentar Evangélica. Questionado sobre o bloqueio do projeto de lei do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que regulamenta o casamento entre pessoas do mesmo sexo, disse que a "sociedade já rejeitara o assunto". Qual sociedade, deputado? Aquele representada no Congresso Nacional? Ou a que esta do lado de fora, diferente e plural?
Como o Parlamento não cumpre suas responsabilidades, entre elas, a de assegurar direitos para todos, independente de sua fé, convicção política, filosófica, cor, raça, gênero ou orientação sexual, o Judiciário cada vez mais é chamado a intervir. Como o guardião da Constituição, cabe ao STF decidir se um direito se aplica ou não. Assim como fez no caso da equivalência da união estável entre casais formado por pessoas do mesmo sexo e de sexos diferentes, cedo ou tarde também decidirá sobre o casamento civil para os homossexuais.
A intervenção do Judiciário se torna necessária porque o Parlamento se esquiva do cumprimento das suas responsabilidades. Seus integrantes - deputadores federais e senadores - se tornaram reféns de seus grupos sociais. Esqueceram de que acima da convicção e da fé de cada um está a Constituição Federal, que assegura direitos e ampara todos os cidadãos. E depois ainda tem gente que se julga no direito de reclamar da "judicialização" da política.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Corrupção: a cobertura seletiva da mídia

Duas mil pessoas marcham pela principal avenida da maior cidade do país. Elas protestam contra este que é considerado o mal do século: a corrupção. Em outras capitais também ocorreram protetos semelhantes. A cobertura da mídia foca somente a "corrupção", assim, de forma genérica, sem nenhum tipo de aprofundamento.
Também conhecida pelo vulgo como maroteira, maracutaia, esperteza, a corrupção é um ato que na maioria das vezes envolve recursos públicos. É aquela obra, importante para a população, mas que custa o dobro porque o preço, além de superfaturado, também engloba a comissão do funcionário público que manipulou o edital da licitação, de modo a favorecer o executor do serviço.
Este é apenas um exemplo de corrupção. Existem outros. Muitos outros. E causa indignação em todo mundo. Até mesmo nos corruptos (pelo menos enquanto não são apanhados com a "boca na botija). A diferença reside no fato de como esta situação é percebida pelas pessoas. Hoje, muito mais do que, por exemplo, no final da década de 70, mais denúncias vêm a público porque a imprensa, livre da censura do regime militar, exerce uma cobertura mais intensa. Nem todos os veículos agem assim, é preciso lembrar.
A cobertura dos protestos é seletiva. Foca apenas a "corrupção". Mas, o ato é uma via de mão dupla. Para que ele ocorra é necessário o concurso de dois atores: o corrupto e o corruptor. E aqui, esta a seletividade da mídia. O corruptor é o dono do dinheiro. E, invariavelmente, são grandes empresas (leia-se: grandes anunciantes). Por isso, a cobertura foca apenas os corruptos. Nunca, jamais, os corruptores.
Ela, a mídia, também é corrupta. E quando apanhada em flagrante delito, ignora, finge que nem é com ela. É o que ocorre em São Paulo, onde o partido no governo - o PSDB - "comprou" os veículos de comunicação e, em troca, recebe proteção. Um caso análogo à máfia nos EUA que, nas décadas de 20 e 30, oferecia "proteção" ao comércio de rua em troca de pagamentos semanais regulares.
Quem quer que tenha assistido no Jornal Nacional na quarta-feira, 12 de outubro, a matéria sobre as "marchas contra a corrupção pelas capitais" deve ter estranhado a cobertura rasa do protesto na capital paulista. Isso ocorreu porque os manifestantes, em sua maioria, carregavam cartazes como este da foto abaixo. E a mídia não iria imolar-se em praça pública. Não, isto não é próprio dela.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Até onde vai a inteligência ou crítica da esperteza

O painel do leitor do principal jornal de Campinas, dia sim e outro também, estampa considerações indignadas de leitores contra a chamada "indústria da multa" que, na opinião deles, vigoraria na cidade. Reclamam que o Estado, no caso a prefeitura, só se preocupa em multar para aumentar cada vez a arrecadação e encher os cofres. Chegam até mesmo a insinuar que os agentes de trânsito ganhariam comissão por cada multa aplicada.
Os números das infrações de trânsito na cidade costumam desmentir esta indignação de ocasião. Em 2010, por exemplo, os dados da Emdec, empresa municipal engarregada de adminstrar o trânsito e gerenciar o transporte coletivo da cidade, revelaram que 70% dos autos de infração foram aferidos por equipamentos eletrônicos; basicamente, radares e os chamados semáforos inteligentes. Ou seja,  as multas foram aplicadas porque os motoristas ou excederam os limites máximos de velocidade permitidos ou passaram quando o semáforo já estava no vermelho. E ainda se julgam no direito de apresentar recursos administrativos contra as infrações.
Os 30% restantes estavam relacionados aos autos aplicados por agentes de trânsito. Multas por andar sem o cinto de segurança, dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo, estacionar em local proibido ou sem o cartão da zona azul e beber e dirigir simultaneamente. E neste último caso, a esperteza dos motoristas não tem limites; e costuma ser diferente entre homens e mulheres.
Os homens não se importam nem mesmo em disfarçar. Abrem a lata de cerveja e, enquanto uma da mãos segurança bebida, a outra está no volante. As mulheres, ao contrário, costumam ser mais sutis e, porque não dizer, mais inteligentes. Procuram disfarçar o ato trocado os recipientes da bebida. A mais nova tática consiste em despejar o líquido de lúpulo e cevada dentro de uma garrafa de bebida isotônica. À distância e com o veículo em movimento, será muito difícil para o agente de trânsito diferenciar o líquido. Será que ainda falta mais alguma coisa para ser vista?