quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Bento XVI e as eleições

Uns surpresos. Outros estupefatos. E outros ainda esfregando as mãos. Estas as reações ao discurso do Papa Bento XVI diante de bispos do nordeste brasileiro, que foram à Roma numa espécie de prestação de contas de suas dioceses. O líder dos católicos apostólicos romanos defendeu o direito de padres, bispos e cardeais intervirem no debate político e posicionarem-se em defesa da vida, desde a concepção até a morte natural. Suas declarações chegam às vésperas do segundo turno das eleições brasileiras, marcadas para domingo, 31, após uma campanha em que os valores religiosos permearam os debates.
O discurso de Bento XVI não surpreendeu. Ele apenas refletiu novas as orientações doutrinárias da Igreja Católica de Roma, após a eleição do Cardeal Ratzinger. Seu papado, longe de ser de transição, como chegaram a afirmar no início alguns vaticanistas, é mais de chamamento à unidade católica. Os valores morais que os católicos consideram dogmas serão cada vez mais reafirmados. Neles se inserem a defesa da vida contra o aborto e métodos contraceptivos; ataques aos homossexuais e apoio às tentativas de convertê-los; freio no diálogo interreligiões e recuo no apoio ao ecumenismo, com a reafirmação do primado da Igreja Católica.
Mas, é no front interno que o papado de Bento XVI será mais incisivo. E estas declarações estão inseridas neste contexto. O papa quer qualificar a intervenção dos católicos no mundo laico e, para isso, devem lançar mão dos valores que a igreja considera essenciais. A Igreja Católica de Roma mergulhou de vez na dipusta pelos corações e mentes dos homens e mulheres que habitam esta planeta. Quer sair da inércia e partir para o confronto aberto contra os protestantes (em suas vertentes pentecostais e neopentecostais) e o islamismo.
Os conservadores venceram o grande debate iniciado no Concílio Vaticano II, apesar da euforia inicial dos progressistas. Eles esperaram o tempo certo. O pontificado de João Paulo II serviu como uma cortina de fumaça para o que se fazia por trás dos panos. O carisma de Karol Wojtyla cativava e arrastava multidões. Enquanto isso, nos porões da Igreja Católica, Joseph Ratzinger, o todo poderoso prefeito da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, aparava arestas, acertava as contas com a história e promovia o retorno da igreja à rota na qual ela caminhava há quase dois mil anos.
Morto o papa polonês, era chegado o momento do articulador saltar à ribalta, assumir o comando e colocar em prática tudo o que ele gestara nos 27 anos anteriores.
A Igreja Católica Apostólica Romana vive o seu momento de reafirmação de valores que não necessariamente estão concatenados com a realidade atual. Isto não importa para Bento XVI, mais interessado em fazer com que a igreja se adeque ao molde que ele preparou durante o pontificado de João Paulo II. Se as recentes declarações para os bispos brasileiros vão ou não influenciar o eleitorado brasileiro só a abertura das urnas no domingo vão dizer. Uma dica: pesquisas - qualitativas e quantitativas - apontam para um esgotamento do debate em torno da questão do aborto.

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