terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

O pensamento, no fundo, é raso

O livro à sua frente é grande. Tem mais de 300 páginas. O assunto é até palpitante e atraente. Vale a leitura e, também, porque você precisa fazer uma resenha sobre ele. Mas, aquelas mais de 300 páginas são um obstáculo intransponível. No começo, a leitura é interessante, no entanto, o eterno virar de páginas faz pesar as pálpebras e o sono, ah, o sono, acaba nos derrubando.
O que fazer? Não tem jeito. O negocia é recorrer à versão moderna e tecnológica da Biblioteca de Alexandria, o Google, o site de buscas na internet que é a salvação da lavoura para que não esta muito disposto a enfrentar 300, 400 ou mais páginas preenchidas de letras de cima a baixo, sem nenhum figura para quebrar um pouco aquela monotonia de palavras que, isoladas não fazem nenhum sentido.
No Google é tudo mais fácil. Basta digitar palavras-chave no espaço destinado ao assunto e em questão de segundos milhares de links, com as várias opiniões e versões, aparecem na tela luminosa à nossa. E daí que os escritos não reflitam a nossa própria opinião sobre o assunto? O que importa é a rapidez com que o problema é resolvido. É tudo muito simples: basta selecionar o trecho, copiá-lo e colá-lo na página em branco do processador de texto. Repete-se a operação com outro trecho de textos; e quantos forem necessários para criar o Frankenstein a quem vamos denominar de trabalho científico.
E aqui esta “rebimboca da parafuseta”, como diria o matuto.
Em 2008, o jornalista norte-americano Nicholas Carr assinou, na revista The Atlantic, o polêmico artigo “Estaria o Google nos tornando estúpidos?”. O texto foi capa da revista e, depois de sua publicação, encontra-se entre os mais lidos de seu website. Este artigo foi apenas o aperitivo para o prato principal: o livro, do mesmo autor, “The Shallows: what the internet is doing to our brains” que, na versão em português da obra, recebeu o nome de Geração artificial: o que a internet está fazendo com os nossos cérebros.
O jornalista norte-americano mergulha em dezenas de estudos científicos sobre o funcionamento do cérebro humano. E conclui que a internet está provocando danos em partes do cérebro que constituem a base do que entendemos como inteligência, além de tornar as pessoas menos sensíveis a sentimentos como compaixão e piedade.
As múltiplas possibilidades permitidas pela internet, com seus múltiplos e incessantes estímulos, produzem uma espécie de adestramento das nossas habilidades de tomar pequenas decisões. Os internautas saltam textos e imagens, traçando um caminho errático pelas páginas eletrônicas. Esse ganho, no entanto, se dá à custa da perda da capacidade de alimentas nossa memória de longa duração e estabelecer raciocínios mais sofisticados.
O capítulo 7 do livro, onde Carr introduz estudos científicos sobre o impacto da internet no funcionamento do cérebro humano, é o mais provocativo. Segundo o autor, quando se navega na internet “adentra-se a um ambiente que promove uma leitura apressada, rasa e distraída, e um aprendizado superficial”.
Um dos estudos mencionados na obra revela que leitores de livros apresentam intensa atividade cerebral nas regiões associadas com a linguagem, a memória e as imagens. Em contrapartida, os leitores de páginas da internet, apresentam intensa atividade cerebral nas regiões associadas com resolução de problemas e com tomada de decisões. Essa dispersão da atenção vem à custa da capacidade de concentração e reflexão.
Aqui esta o ponto nevrálgico. Mesmo sem ter lido o livro do jornalista norte-americano, é possível chegar às mesmas conclusões. Quantos de nós não demonstramos certa impaciência e até mesmo sonolência quando, depois de longos períodos de exposição à internet, passamos à leitura de um livro?
O livro de Nicholas Carr vale a leitura. Talvez, estranhamente, depois de lê-lo voltemos nossas atenções para os livros para, desta maneira, negar mais um daqueles vaticínios apressados produzidos a cada vez que surge uma novidade tecnológica: o advento da internet, sua popularização e velocidade no acesso ao conhecimento, levariam os livros ao túmulo. O problema não está em acessar o conhecimento, mas, sim, o que fazer com ele depois disso.

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