quarta-feira, 2 de junho de 2010

O celibato está na berlinda

Um dos dogmasda Igreja Católica, o celibato, encontra-se sob fogo cerrado. A castidade, ao lado da obediência e da pobreza, é um dos três votos que o candidato a clérigo deve submeter-se. Mas, a descoberta de milhares de casos de pedofilia envolvendo membros do clero no mundo inteiro trouxe questionamentos sérios à obrigatoriedade do padre ser casto. Os críticos apontaram o celibato como uma das causas da pedofilia.
Ao contrário do que se possa pensar, no entanto, a castidade não nasceu com a própria Igreja. Em termos históricos, ela é relativamente jovem - tem apenas cinco séculos -, levando-se em consideração que a igreja tem mais de dois milênios.
A primeira menção ao celibato obrigatório surgiu no Concílio Regional de Elvira, na Espanha, em 304. Era a forma escolhida pelos bispos da região para "selecionar" aqueles que queriam ser sacerdotes. Na Idade Média, a castidade passou a ser conveniente para a Igreja manter intacto seu patrimônio material, evitando que descendentes levassem terras e outros bens deixados por sacerdotes. Algo puramente venal e nada espiritual.
O Segundo Concílio de Latrão, em 1139, ampliou o celibato para todo o Ocidente. Mas, só em 1563, no Concílio de Trento, ficou estabelecido que o rompimento do voto de castidade seria punido com a excomunhão.
O conflito com o celibato na Igreja é um dos grandes desafios do sacerdócio. Perturba padres há séculos - pelos menos 39 papas casaram e tiveram filhos - e continua a ser um dos problemas mais sérios do Vaticano. O cerco, porém, está se fechando cada vez mais.
Representantes de um grupo de mulheres que dizem ter relações sentimentais com sacerdotes católicos divulgaram uma carta que enviaram ao Vaticano para pedir o fim do celibato para os padres. O grupo é formado por cerca de 40 mulheres de várias cidades da Itália, que tiveram ou ainda têm um relacionamento com padres católicos. "Estamos acostumadas a viver de forma anônima os poucos momentos que os padres nos concedem e vivemos diariamente o medo e as inseguranças dos nossos homens, suprindo suas carências afetivas e sofrendo as consequências da obrigação do celibato", diz o texto da carta enviada a 150 órgãos de imprensa italianos.
Apesar de o grupo ter cerca de 40 mulheres, apenas três tiveram coragem de assinar a carta: Antonella Carisio, Maria Grazia Filipucci e Stefania Salomone. As outras preferiram continuar no anonimato.
Stefania Salomone disse à BBC Brasil que, por estarem próximos do Vaticano, todos se sentem amedrontados. "As mulheres, os padres e as pessoas que sabem dos casos preferem não falar. Por causa disso é difícil que na Itália exista uma verdadeira associação, como existe na França, na Suiça ou na Espanha", diz.
Quando um caso é descoberto, a primeira providência do Vaticano é transferir o padre de paróquia, que deixa para trás uma mulher que arriscou tudo para viver um amor sabidamente proibido.
Antonella Carizio, de 42 anos, divorciada, com um filho de 15 anos, viveu esta experiência. Ela conta que, durante dois anos, se relacionou com um padre brasileiro. Depois que o caso veio à tona, o sacerdote foi mandato de volta para o Brasil. "Tenho certeza que ele quis voltar ao Brasil para colocar um fim no nosso relacionamento, que foi muito intenso", lamenta.
Antonella avalia que os sacerdotes não tem o apoio necesário para enfrentar os problemas ligados à sexualidade e aos sentimentos. "Nos seminários ensinam apenas a excluir os sentimentos da própria vida e criar uma parede entre si e os outros. Como podem entender certas situações que nunca viveram?", questiona.
Dificimente um padre que se envolve com uma mulher abandona o sacerdócio. A maior parte prefere ter as duas coisas, pois não suportam deixar de ser ministros sagrados para entrar na rotina do casamento.
O Vaticano precisa encontrar de maneira urgente uma fórmula para resolver a equação, porque a cada ano aumenta mais o número de padres que abandonam a batina para se casar. Um estudo publicado pela revista italiana Civiltà Católica, da Ordem dos Jesuítas, aponta que em 40 anos, de 1964 a 2004, 69 mil padres deixaram o sacerdócio no mundo. A maior parte dos pedidos de dispensa, de acordo com o estudo, deve-se a situações de instabilidade afetiva.

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